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O
início foi num fevereiro de calor insuportável.
Segundo as histórias
que conta meu amigo Lorenzo, o rock e os embalos dos anos oitenta só
terminaram mesmo nos noventa, com o rebolar de loiras e alguns sertanejos
assumindo as primeiras posições nas paradas de sucesso durante
um verão de calor insuportável. Os sonhos de liberdade,
democracia e rocks em versão brasileira, lançados publicitariamente
no Rock in Rio, terminaram com muita gente procurando por outras cidades
e países para viver ou tentar a sorte. O país entrava em
crise (grande novidade!) e entre a garotada faltavam empregos, diversão
e outros badulaques castrados por uma
globalização sertaneja, ao som de Pensa em mim tocando sem
parar nas rádios. Para muitos aquilo era o inferno e quase uma
ofensa de mau gosto, e o mesmo aconteceu com bundas gostosas, loiras e
os rebolados que chegaram depois. Mas como, e por quê resistir a
uma nova onda de sucesso e consumo se com o tempo todo mundo esquece?
Ser jovem foi uma
das maiores invenções do marketing no pós-guerra,
pois além de servir para vender produtos como tênis, discos
e roupas, também serviu para criar e ampliar mercados consumidores.
O pessoal de esquerda radical pode não gostar muito dessa idéia
mas, no Brasil, isso ficou claro quando as conquistas de liberdade para
votar e falar o que se pensa chegaram junto com a cultura de consumo que
temos até hoje. O mesmo aconteceu com os países do leste
europeu e provavelmente também acontecerá com o Iraque.
A novidade, passadas e esquecidas algumas ondas de verão, é
que ser jovem atualmente também significa ter alguma consciência
sobre os destinos do planeta e das cidades nas quais vivemos. Sobre o
que nossos hábitos de consumo causam no meio-ambiente e o que nossos
governantes estão fazendo com os votos e o poder que lhes conferimos.
Isso tudo pode parecer algo como plantar margarida e nascer tomate, mas
hoje o Brasil parece melhor para se viver do que aquele fevereiro de calor
insuportável. O mundo deu algumas voltas, temos mais consciência
sobre nossos problemas e capacidade de enfrentá-los. Resta saber
qual será a próxima onda de verão.
Tomara que tenhamos sorte na música.
Mauro Dahmer revista
mtv - julho 2003
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