RIO-SANTOS
Ou Uma pequena história de corrupção
cotidiana
2001 está chegando ao fim e nossa odisséia pelo espaço
parece que pirou de vez o Brasil. Cinco policiais são presos
na cracolândia, em São Paulo, acusados de chefiar o tráfico
de drogas. Enquanto for possível, a corporação
logo é defendida do constrangimento provocado por alguns elementos
que não podem manchar a honra de todos. Vale o aviso de que sob
a atual legislação brasileira de drogas, policiais corruptos
que se envolvem com o tráfico não são excessão
e sim regra. Regrinha do mundo real.
Vou contar uma história
que ouvi por aí mas que acontece todos os dias, em muitas cidades
do Brasil.
Um jovem casal fazia uma viajem pela Rio-Santos, famosa e lendária
estrada-ícone da contracultura brazuca. Ela é filha de um
Juiz e estuda arquitetura na USP. Ele é músico e dono de
uma loja de discos num shopping center. Moram juntos num apartamento do
Sumaré, bairro jóia da paulicéia.
Depois de passar dois dias na praia de Itamambuca meus amigos tomaram
o rumo de Parati. Foi quando o rapaz lembrou de um baseado que trazia
consigo e da péssima fama da polícia rodoviária daquela
região. Como nosso amigo não é idiota escondeu o
pequeno embrulho no forro de uma bolsa e seguiu viagem atento. Quase chegando
em Parati o prenúncio se realizou numa blitz, da qual um dos tiras,
mais ou menos composto, disse tratar-se de uma ação para
previnir o tráfico de drogas e armas na região. Depois de
conferir os documentos o mesmo sujeito pediu ao casal para que descessem
do carro afim de que ele pudesse revistar o compartimento do veículo.
Durante a revista foi encontrada no assoalho do carro uma pequena cinza
de maconha que logo foi anunciada como prova de crime pelo paladino da
justiça. Meu amigo, de bom senso, cheirou e achou por bem concordar
com o policial. Avisou que de fato fumava alguns baseados recreativamente
mas que trabalhava num shopping e levava uma vida razoável e longe
de encrencas. De nada adiantou ser sincero até porque um deles,
cada vez mais ameaçador e nervoso, chegou a exigir que o rapaz
baixasse as calças para ver se não escondia nada nas cuecas.
Começou a revistar as malas e, pasmem, uivou quando encontrou um
baralho e uma pequena garrafa de uísque. Eram duas da tarde, sob
um sol quente de verão quando o sujeito de uniforme suado disse
que estava chegando perto de alguma coisa. Sentia o cheiro da recompensa.
Francamente aterrorizado e querendo se safar da encrenca em que estava
metido, o rapaz negou carregar mais maconha consigo e tentou convencer
a dupla da lei de que aquela cinza era fruto de fumaças passadas.
Por sorte o faro dos porcos passou longe da mala do crime. Caso isso tivesse
acontecido o casal certamente teriam perdido um bom dinheiro e sabe-se
lá o que mais. Em todo caso, foram suficientemente humilhados por
50 minutos e pela situação corrupta gerenciada pelos homens
da lei. Tudo por uma cinza. Vale lembrar que ambos tem boa escolaridade,
família e formação superior. Imagine o que rola com
o pessoal do busão.
A história nem é das piores mas vale pela banalidade com
que se repete diariamente com milhares de jovens de todas as classes sociais
do Brasil. Esse é apenas um pequeno exemplo de como uma legislação
atrasada favorece o crime cometido por agentes do estado. Situação
em que a sociedade perde tanto pelo desgaste da lei que não se
cumpre e nem atende a cidadania, quanto por promover o crime dentro e
fora do estado.
Daí resulta a sensação de que no Brasil as leis são
feitas exatamente por aqueles que burlam a lei. Juízes, deputados,
empresários, traficantes e policiais.
É relativamente tácito o acordo de que prender alguém
por porte de pouca quantidade de drogas não é algo muito
justificável, inclusive perante a justiça. Custa caro, não
melhora as estatísticas, cria confusões burocráticas,
o processo não anda e estigmatiza, entre outros transtôrnos
causados. Muito barulho por nada diría Shakespeare. Neste caso
a lei não é apenas cega mas também é burra
pois termina por instrumentalizar o foco do crime e da corrupção
contra gente comum.
Óbviamente é preciso combater o tráfico de drogas
e de armas com inteligência e rigor mas diversos países andam
discutindo o assunto e construindo modelos alternativos. Entre eles, Portugal,
Inglaterra e Holanda fizeram avanços importantes ao modelo de guerra
proposto pelos EUA.
Até o momento a sociedade brasileira parece tolerante, adormecida
e incapaz na sua própria ignorância. Um bom exemplo foi a
reação da TV Cultura no episódio da Soninha no qual
parece ter faltado exatamente informação e cultura a um
orgão do estado.
É nesse espaço que qualquer gambé se mete a valente,
homem da lei que é, de um país tão meia-boca e que
faz esse tipo de lei que não pega. Tudo isso transforma as ruas
num inferno e fica a questão: não sería óbvio
tentar algo mais tolerante com o usuário recreativo da maconha,
por exemplo? Mesmo essa proposta de submeter o usuário a prestar
serviços à comunidade deve ficar cargo de assistentes sociais
e psicólogos e não de policiais. É preciso tirar
o pé da lama com presteza neste momento.
Mauro Dahmer
dez.2001
p.s.
Circula no congresso um projeto com a nova política nacional de
drogas e, como sempre, pouco se discutiu. A UNE esteve por perto? Algum
evento público foi marcado? Os surfistas participaram? Ou será
que nossos parlamentares tentaram se precaver de pressões da sociedade
fazendo tudo nas sombras? Existem pontos positivos no projeto mas é
difícil que tão importante assunto seja tratado longe dos
olhos públicos e de forma bacharelesca. O processo de discussão
das leis educa um povo e é fundamental para a construção
da cidadania. Isso, ao contrário daquilo que pensam os autoritários,
certamente ajuda na prevenção ao uso de drogas.
Aquele modelito que
presumia simplesmente copiar o padrão do andar de cima acabou,
até porque o andar de cima tremeu.
A Argentina está
de joelhos, o WTC no chão e, por enquanto ninguém sabe o
que vai acontecer com o planeta mas é certo que anda pegando mal
tanta hipocrisia. O pessoal desenvolvido já se deu conta do tamanho
da encrenca e tenta baixar a bola do consumo.
Enquanto isso, aqui na Patavina é melhor ter cuidado quando se
vai a Parati.
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Maio de 2002. Aqui vamos às turras rumo à primeira eleição
presidencial do novo milênio. Todo mundo anda meio assustado, inclusive
os líderes do PT, apesar do primeiro lugar nas pesquisas. É
porque politicamente não sabem o que fazer caso assumam o governo.
O cenário mundial está em chamas e pouca coisa parece que
vai ficar de pé depois da onda neo-liberal. Vamos voltar aos fuscas
e à Telebrás? Tomara que não, e certamente não
faltarão iluminados em um possível governo petista para
avisar ao pessoal do leninismo que democracia é coisa um pouco
mais complicada do que sindicato. No sul a coisa funcionou mas tambbém
ñão faltam exemplos de erros em administrações
petistas.
25% dos policiais do Denarc são investigados por corupção
ou afins. Daí o delegado chefe do Denarc - tido como herói
na solução de um caso de sequestro - foi envolvido num esquema
de propina e favorecimento ao conrabando. Outro policial do mesmo departamento
foi preso no Rio tentando embarcar alguns quilos de cocaíina para
a Europa. Voltaria tazendo ecstasys. Barra pesada, hein? Quando custa
tudo isso pra a sociedade? Esses são os exemplos de que a atual
legislação favorece o trafico e o consumo problemático
das drogas. 25% não é excessão, é regra!!!!
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